Passe versus boa decisão

Analisando a segunda parte do jogo França X Portugal, salta à vista o passe de Benzema para o golo de Pogba em contraponto com o passe de Éder para o remate, sem êxito, de Ronaldo. Este lance ajuda a explicar a importância da tomada de decisão, mas principalmente da importância da qualidade do passe e o momento em que ele é executado. Ambos os jogadores decidiram bem (ainda assim, um melhor que o outro), mas apenas um deles manifestou uma boa técnica de passe. Quem executou bem viu a sua equipa marcar (o fim último do futebol). Quem executou mal viu a sua equipa falhar. Haverá oportunidade para falar nas qualidades e nos defeitos do avançado francês (num post futuro), mas o que importa aqui é centrar na máxima pensar bem é importante, executar corretamente é muito mais.

Passemos à análise:

Benzema:

No lance que antecede o golo de Pogba, Benzema viu-se confrontado, pelo menos, perante três opções: rematar/contemporizar/passar.

Rematar: Marcado de perto por Ricardo Carvalho, a hipótese de Benzema ter sucesso (leia-se, marcar golo), seria reduzida. A técnica de remate tampouco lhe valeria de muito, porque rematar naquele espaço exíguo de terreno com um adversário à sua frente estaria potencialmente reduzido ao fracasso.

Contemporizar: Guardar a bola na grande área adversária com vários adversários na sua zona de ação obrigaria Benzema a perder tempo e a virar-se de costas para o objetivo (baliza/golo). Esta solução aumentaria a possibilidade de insucesso (só haveria sucesso se eventualmente ganhasse um penalty perante um erro crasso do adversário), porque contemporizar em zonas de terreno lotadas de adversários normalmente dá falta (tratando-se da grande área esta hipótese desce radicalmente) ou perda da posse da bola. Havendo outra tomada de decisão disponível, que potencia o sucesso, a contemporização perdeu naturalmente a sua razão de ser.

Passar: Benzema, no momento em que tem a bola, tem um colega (Pogba) a vir nas suas costas sem oposição frontal (Pogba está posicionado entre Ricardo Carvalho e Eliseu) e portanto numa situação mais favorável para faturar. Lateralizando a bola com conta, peso e medida, Benzema potenciou as hipóteses do equipa marcar. A forma como o francês colocou a bola (rasteiro e sem imprimir demasiada velocidade à bola) foi meio golo. Pogba, bem posicionado, com tempo para tirar as medidas à baliza, confirmar o posicionamento dos oponentes e focar-se no local e momento onde o seu pé se encontraria com a bola, concretizou o golo.

Éder:

No lance que antecede o falhanço de Ronaldo, Éder viu-se confrontado, pelo menos, perante três opções: rematar/contemporizar/passar.

Rematar: De costas para a baliza e marcado de perto por Mangala, a hipótese de Éder ter sucesso (leia-se, marcar golo), seria reduzida. A técnica de remate tampouco lhe valeria tal como explicado anteriormente (com a agravante de estar de costas para a baliza e da bola vir pelo ar).

Contemporizar: Guardar a bola na grande área adversária com vários adversários na sua zona de ação obrigaria Éder a perder tempo. Esta solução aumentaria a possibilidade de insucesso pelas razões já explicadas. Havendo outra tomada de decisão disponível, que potencia o sucesso, a contemporização perdeu naturalmente a sua razão de ser.

Passar: Éder, no momento em que recebe a bola, tem um colega (Ronaldo) a vir do seu lado direito, de frente para a baliza, com menor oposição (porque o adversário direto estava mais longe) e com maior ângulo para rematar e portanto numa situação mais favorável para faturar. Lateralizando a bola com conta, peso e medida, Éder potenciaria as hipóteses da equipa marcar. A forma como o português colocou a bola aos trambolhões (em balão) e demorou em decidir (não devia ter deixado a bola bater no chão) agravou as hipóteses de golo. Ronaldo, bem posicionado (não tão bem posicionado como Pogba e não tão bem posicionado se o Éder tivesse colocado de pronto a bola), com tempo suficiente para tirar as medidas à baliza, confirmar o posicionamento dos oponentes e focar-se no local e momento onde o seu pé vai bater a bola (tarefa mais difícil para o português porque quando a bola vem numa trajetória pouco linear e pelo ar, o cérebro humano tem que fazer mais cálculos para decifrar o local e o momento exato em que  o remate se dá) falhou o golo. Boa tomada de decisão de Éder ainda assim mas péssima execução técnica de passe (a forma como este faz o passe com a bola a saltitar à sua frente é nitidamente inferior ao que o francês fez perante a mesma problemática).

Para sermos justos importa referir que, por um lado, Éder  tinha uma tarefa um pouco mais difícil porque o passe veio pelo ar enquanto o francês recebeu a bola pelo chão, mas por outro, tinha confronto visual com recetor do passe, enquanto o francês não. De qualquer maneira Éder nunca deveria ter deixado a bola bater à sua frente, mas atacá-la de imediato e colocá-la pelo chão para Ronaldo rematar. Não custa acreditar se no lugar do Éder tivéssemos um Benzema, Ronaldo provavelmente teria sido alvo de uma melhor assistência e teria marcado. Isto ajuda a explicar porque Ronaldo marca muito mais no Real Madrid que ao serviço da Seleção.